Antígona: Desobedecer é preciso
- heurekasite
- 1 de mai.
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Atualizado: 29 de out.

Antígona, de Sófocles, é uma tragédia com mais de dois mil anos que continua a interpelar-nos profundamente. A sua força reside na universalidade das questões que levanta: a tensão entre a lei e a justiça, a obediência e a consciência individual, o poder e a ética. A voz de Antígona ressoa com particular intensidade, lembrando-nos da importância de resistir, de questionar e de pensar criticamente o que é justo.
Um evento em comemoração da Liberdade, que abre com a declamação teatralizada de um excerto da tragédia. Seguem-se as intervenções de Marta Várzeas (Professora da Universidade do Porto) e António Garcia Pereira (Advogado e Professor Universitário), moderadas por Carlos Liz (Investigador do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra).
Este é um formato criado por Ana Alexandra Alves de Sousa (Professora da Universidade de Lisboa). A declamação será protagonizada por Mariana Tapada Marques (Antígona), Beatriz Vashkova (Ismena) e Gil Raposo (Creonte), dará o tom para o debate sobre a actualidade desta obra clássica.
Os oradores partirão de perspetivas distintas para aprofundar os temas centrais da tragédia e os desafios ético-jurídicos que a peça continua a colocar no nosso tempo.
Marta Várzeas
Professora na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e Investigadora no Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra. Doutorada em Literatura Grega.
Autora de diversos artigos, livros e traduções de textos clássicos, incluindo Antígona de Sófocles, que foi recentemente publicada pela Editora Relógio de Água (2024).
Quando a letra mata: lei e justiça na Antígona de Sófocles.
Na Atenas democrática do séc. V a.C., em que a tragédia Antígona foi composta e apresentada a público, a absoluta soberania da lei era motivo de grande orgulho para os Gregos, cuja liberdade contrastava com o modo de vida dos Bárbaros – os Persas, por exemplo, subjugados ao Grande Rei. Não é, porém, um espírito de exaltação pelo regime que percorre a peça de Sófocles. Pelo contrário, ela aponta para os problemas decorrentes de uma espécie de “furor legislativo” que faz tabula rasa dos costumes ancestrais, isto é, da memória comunitária e procura criar uma ordem nova, ambição de muitos governantes recém-chegados ao poder, ontem como hoje, tiranos ou democratas.
António Garcia Pereira
Advogado, Professor Universitário e Investigador no SOCIUS – Centro de Investigação em Sociologia Económica e das Organizações do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa, e no CEJEIA – Centro de Estudos Jurídicos Económicos, Internacionais e Ambientais da Universidade Lusíada. Doutorado em Direito.
Autor de diversos artigos e livros, foi distinguido, em maio de 2024, com o Prémio Nelson Mandela, pela Associação ProPública — Direito e Cidadania, e, em dezembro de 2024, com o Prémio Tágides: Pessoas que nos inspiram no combate à corrupção, na categoria “Projecto da Sociedade Civil”, atribuído pela Associação All4Integrity.
O direito e o dever de resistência a ordens ilegais: da Antiguidade aos nossos dias.
A questão filosófica e até política – mas que é também ética e, em certa medida, jurídica – magistralmente colocada pela peça Antígona, de Sófocles, relativa à desobediência perante leis injustas ou ordens ilegítimas emanadas de poderes absolutos, revela-se, afinal, de uma enorme e incontornável atualidade. Antes de mais, porque é nela que se inspira a moderna problemática do confronto entre a lei vigente (o “Direito Positivo”), emanada do órgão formalmente competente para a produzir, e os grandes princípios, identificados por alguns como pertencentes ao “Direito Natural”, ou aos fundamentos da chamada Constituição material. Mas também porque tal questão remete para o eterno e essencial debate acerca do que deve, afinal, fazer cada ser humano diante de uma lei ou uma ordem que, ainda que formalmente lícita, se revele profundamente injusta.
Na verdade, se, na madrugada de 25 de Abril de 1974, a velha máxima fascista “manda quem pode, obedece quem deve” tivesse sido obedecida, não estaríamos, decerto, aqui hoje...
Local
Biblioteca Camões
Palácio Valada-Azambuja
Largo do Calhariz, n.º 17, 1.º Esq.
1200-086 Lisboa
A Biblioteca Camões encontra-se localizada num edifício repleto de histórias e memórias lisboetas. Após o terramoto de 1755, foi reconstruído por iniciativa do Marquês de Pombal sobre as fundações de um antigo palácio do século XVI. O edifício foi, em diferentes épocas, residência familiar, sede do jornal A Lucta, refúgio de conspiradores e, ainda, local da primeira biblioteca para cegos no país.
Já aconteceu!
No dia 2 de maio, celebrámos a Liberdade com um encontro memorável na belíssima Sala Lisboa da Biblioteca Camões. O ponto de partida foi Antígona, de Sófocles — uma tragédia intemporal que nos levou a refletir sobre a desobediência, a justiça e a força da consciência individual.
Tivemos o privilégio de ouvir intervenções marcantes da Professora Marta Isabel Várzeas (Universidade do Porto) e do Professor António Garcia Pereira, advogado especialista em direito do trabalho, que trouxeram à discussão perspectivas profundas sobre o papel da lei, do poder e da resistência.
A sessão abriu com a declamação de excertos da tragédia, com interpretações intensas e comoventes de Mariana Tapada Marques (Antígona), Beatriz Vashkova (Ismena) e Gil Raposo (Creonte), estudantes de teatro.
Com a cidade de Lisboa como pano de fundo, partilhámos ideias, inquietações e esperanças. Porque compreender o passado é essencial para construirmos um futuro — e, por vezes, desobedecer é um ato de liberdade.
(Ana Alexandra Alves de Sousa)

















































